<% pagina = "http://" & request.ServerVariables("HTTP_HOST") & request.ServerVariables("URL") %> Ciência & Comunicação - Comunicações
Volume 3
Número 4

20 de julho de 2006
 
 * Edição atual    

          Jornalismo Científico, por Maysa Salles da Costa Lima

          Vera Rolim Salles é professora da Fundação Instituto Tecnológico de Osasco (FAC-FITO).

          "A Declaração Sobre a Ciência e o Uso do Conhecimento Científico, adotada pela Conferência Mundial de Budapeste realizada pela UNESCO, reconheceu que o acesso ao conhecimento científico, a partir de uma idade muito precoce, faz parte do direito à educação de todos os homens e mulheres, e que a educação científica é de importância essencial para o desenvolvimento humano, para a criação de capacidade científica endógena e para que tenhamos cidadãos participantes e informados. A Declaração insiste em que a educação em ciência, sem discriminação e abrangendo todos os níveis e modalidades, é um requisito fundamental da democracia e também do desenvolvimento sustentável." Werthein

          A divulgação científica é hoje instrumento essencial na democratização do conhecimento, como forma de promover o diálogo entre a esfera dos artigos científicos e a sociedade, não apenas na forma de simples difusor de informações, mas também como uma pré-condição do avanço econômico e tecnológico. Nos últimos anos, vem sendo dada, em nosso país, uma maior importância à veiculação da ciência para os leigos, o que pode ser comprovado através do número crescente de veículos e canais que vêm sendo criados para incrementar este diálogo.

          Segundo a professora Vera Rolim Salles, da Fundação Instituto Tecnológico de Osasco (FAC-FITO), tem ocorrido um incremento da divulgação científica no Brasil nos últimos dez anos, tanto em quantidade como em qualidade, especialmente devido à consolidação de editorias especializadas em Ciência nos grandes jornais. Entre os meios de comunicação brasileiros especializados mais competentes, a professora destaca as Revistas da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e da Fapesp e as emissoras de televisão Cultura e Globo.

          Em contrapartida, ressalta, o Brasil é um país de ensino deficiente, onde a alfabetização científica é precária e o incentivo do governo à educação é muito pequeno. Mesmo quando a pessoa apresenta boa formação, os valores da sociedade atual são vinculados diretamente ao mercado. A professora aponta esta deficiência no ensino público como uma das causas do analfabetismo que, consequentemente, acaba por gerar a falta de acesso às informações. Tais deficiências têm reflexo direto na mídia televisiva, onde programas educacionais e de temas científicos não recebem o espaço adequado: "(...) a televisão aberta, que é uma das mídias mais assistidas no país, dedica pouco espaço à ciência, colocando programas sobre temas científicos em horários de baixa audiência", completa a professora.

          Apesar da ampliação da ciência e tecnologia como temas nos veículos de comunicação, inúmeros problemas caracterizam a cobertura. A professora aponta, dentre eles, a preferência da mídia por assuntos bizarros, de maior apelo do povo, e o tratamento sensacionalista das notícias como forma de vender mais facilmente a informação. No entanto, o profissional deve buscar ser competente a ponto de não perder a credibilidade, precavendo-se contra informações de idoneidade duvidosa apenas para conseguir maior audiência.

          A linguagem dos artigos, bem como a competência do jornalista, são fatores determinantes para o sucesso na transmissão da informação, o que implica necessariamente em profissionais que saibam comnunicar-se de forma atraente e correta. O risco de distorção é inerente à tarefa de transmitir a informação, mas pode ser minimizado pelo jornalista por um maior domínio do assunto em pauta.

          A jornalista julga que formação de jornalistas científicos no Brasil ainda é deficiente, talvez pela existência de poucos cursos voltados para esta questão (cita o Laboratório de Jornalismo Científico da UNICAMP como referência. A professora destaca a importância da formação de jornalistas científicos em cursos de especialização apropriados que estejam vinculados especialmente às instituições científicas, universidades e que tenham espaço na grande espaço, como por exemplo, Grupo Folha, Estado, Abril e Globo.

          Além da falta de incentivo na formação de profissionais competentes, constata-se também grande resistência dos cientistas em relação à mídia e a divulgação de seus trabalhos. Cientistas e jornalistas possuem regras próprias e interesses diversos, o que favorece a ocorrência de atritos neste relacionamento. Escrever sobre ciência para um público leigo exige simplificação e apelo, já que o veículo precisa "vender" a informação e despertar o interesse do receptor. Como o cientista privilegia o trabalho metódico, lento e preciso, onde não se postulam "verdades" e sim paradigmas provisórios , ele teme a generalização e distorção como forma de atrair o interesse da população.

          Vera Salles julga ser difícil o convívio entre os "donos" das informações e os responsáveis pela sua transmissão ao público leigo:"(...) é uma questão de linguagens e formações diferentes; a do profissional jornalista voltada para o geral e a do cientista para o específico". Concorda com o fato de o cientista julgar-se mais sábio que o profissional de comunicação, uma vez que o primeiro dispõe no curriculum de uma formação de pelo menos 4 anos no assunto, em contraposição às noções gerais do jornalista.

          Como exemplo de relação saudável entre jornalista-cientista, a professora Vera R.Salles relata uma experiência profissional positiva vivida há dois anos na SBPC, quando coordenou a edição e publicação de suplementos sobre ciência em jornais. Eles tinham como objetivo dar suporte aencontros regionais de professores do ensino médio realizados em várias capitais do país e baseavam-se em materiais, informações cujas fontes eram os pesquisadores. Desta relação, ela guarda lembranças positivas, considerando a experiência rica exatamente porque se baseou em um trabalho em conjunto e em parceria.

          Vera Salles julga que é preciso fazer uma distinção entre a disseminação científica e a divulgação científica. A divulgação científica veicula informações de linguagem acessível para o público leigo através do trabalho de jornalistas responsáveis. Já a disseminação científica preocupa-se em produzir textos especializados, através dos próprios pesquisadores, carregados de detalhes e termos técnicos para conhecimento e debate da comunidade científica. Atualmente, existem universidades e instituições de pesquisa no Brasil que possuem veículos de informações científicas de acesso livre ao público. No entanto, conforme a jornalista, esse trabalho ainda precisa melhorar, uma vez que inúmeras teses e monografias , resultado de pesquisas importantes, ainda permanecem arquivadas e não chegam ao conhecimento do público. Além disso, o há um descompasso que precisa ser reduzido: nos centros de pesquisa ainda se investe mais na transmissão do conhecimento entre os próprios cientistas do que na divulgação para a população.

          Vera Salles defende a tese de que o progresso da divulgação científica depende de três personagens principais que devem estar articulados: o pesquisador (a fonte), o jornalista ( que veicula a informação) e o público alvo, que normalmente estão inseridos num contexto político, caracterizado por interesses e disputas de poder.. É preciso, segundo ela, que a sociedade esteja disposta e mobilizada para lutar pela transparência da informação como um direito do cidadão, que incentive e valorize a democratização do conhecimento, que favoreça o fomento de novas pesquisas e que apoie o desenvolvimento tecnológico efetivamente comprometido com o desenvolvimento econômico e social.

 

 
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