Volume 3
Número 5

20 de dezembro de 2006
 
 * Edição atual    
Documento sem título

          Como aproximar a ciência e o cidadão

Soraya Pereira*

           Pesquisa realizada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia já em 1987 (A imagem da ciência e tecnologia junto à população urbana brasileira), e refeita em outros anos, revelava que as pessoas se interessam por ciência e tecnologia e gostariam de ver assuntos relacionados a essa área com mais freqüência na mídia. No entanto, apesar do indicativo, poucos projetos editoriais ganharam corpo. Entre os motivos podem estar a falta de preparo para cobertura desses temas, a dificuldade de relacionamento entre jornalistas e pesquisadores e problemas nas estratégias de comunicação.

           Em relação à imprensa, alguns estudos mostram a dificuldade de divulgar o processo científico. Um artigo do professor Wilson Bueno, da Universidade Metodista de São Paulo, ele expõe a necessidade da mídia resgatar o sentido autêntico da ciência, como uma aventura humana, voltada para a descoberta e para realização do talento humano. Para isso, é preciso que o jornalismo se liberte da apologia dos resultados e do exótico e destaque o processo de criação numa perspectiva crítica e contextualizada.

           Algumas poucas instituições como a Embrapa, o Museu Emílio Goeldi (PA) e a Universidade de Campinas (SP) investiram na contratação de profissionais da área de comunicação com o intuito de facilitar o contato com jornalistas e comunidade em geral. A iniciativa deu maior visibilidade a esses centros de pesquisa e tem contribuído para aproximar diversos públicos que se beneficiam do conhecimento gerado pelos pesquisadores.

           Por outro lado, muito ainda precisa ser feito para que a comunicação se estabeleça naquelas regiões onde as distâncias impõem limites quase que intransponíveis. Há poucos dias, visitei uma comunidade de pequenos produtores de abacaxi a 100 km de Rio Branco (AC) e notei a falta de informações relativas à cultura. Quando questionei sobre o acompanhamento de notícias que tratam do universo rural em rádios, TVs e jornais, as respostas soaram como um alarme.

           Mesmo o rádio, um veículo de grande alcance, tem perdido espaço para a TV com a chegada da energia elétrica. Ao mesmo tempo, aquelas casas não recebem o sinal da TV local. Portanto, mais que saber produzir uma boa pauta sobre ciência e tecnologia é preciso desenhar estratégias para que a informação chegue e reverbere.

           Neste contexto, a Embrapa adotou algumas estratégias. Uma delas é o programa de rádio Prosa Rural, que tem formato e duração definidos, se pauta por temas de aplicabilidade no cotidiano rural e é distribuído gratuitamente para mais de 570 rádios comerciais e comunitárias nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Em 15 minutos, assuntos peculiares de cada região são discutidos com pesquisadores e produtores e ainda há espaço para manifestação cultural com obras de artistas da terra ou receitas típicas. No Acre, o Prosa é transmitido pelas rádios Aldeia FM (sábado, 7h), Difusora (sábado, 17h) e Alvorada (sábado e domingo, às 5h).

           As opções de horários, dias e freqüências ampliam as chances de audiência do programa. No entanto, reconhecemos que é preciso melhorar alguns aspectos, principalmente a linguagem radiofônica e o uso de "temperos" como salientou a jornalista Mara Régia que produz, há 14 anos, o programa Natureza Viva, que trata de assuntos da Amazônia e a vida das populações tradicionais da região.

           Os temperos são todas as coisas que dão ritmo, enriquecem a sonoridade e pluralizam a mensagem. Recursos que Mara Régia domina como ninguém a ponto de mobilizar pessoas a saírem da mata e descerem os rios só para enviar uma carta ao programa. Por ano, o Natureza Viva recebe mais de 500 cartas vindas de ouvintes dos lugares mais remotos da Amazônia. É uma experiência que precisa ser melhor documentada para trazer subsídios a projetos similares.

           Mas para que as estratégias de comunicação encontrem eco a outra ponta tem que estar apta para receber a mensagem. A educação surge como componente chave e por isso a Embrapa Acre tem investido no fomento de minibibliotecas em comunidades rurais. O projeto piloto teve início esse ano com foco em Assis Brasil, Brasiléia, Epitaciolândia, Xapuri e Capixaba. O objetivo é ter um acervo diversificado para despertar o gosto pela leitura e, a partir dela, ampliar os horizontes daqueles que assumirão a propriedade. Esse projeto, conduzido pela analista Mauricília Pereira, realizou oficinas com professores para discutir formas prazerosas de leitura, tornando-a parte do dia-a-dia.

           Paralelamente, estão sendo produzidos spots de um minuto para rádio com soluções para as principais questões do campo como conservação do solo e produção de sementes. Alunos da Escola Técnica de Comunicação, do Centro de Educação Profissional Campos Pereira, deram voz aos spots dramatizados. E outros estão sendo produzidos com testemunho dos próprios agricultores que falam da experiência com algumas tecnologias. Por serem curtinhos, os spots poderão entrar a qualquer momento na programação das rádios várias vezes por dia. A veiculação terá início em 2007.

           O acesso às informações de ciência e tecnologia é premissa para o exercício da cidadania porque na medida em que a população tem elementos para refletir pode decidir sobre seu destino. Por isso, a comunicação tem papel fundamental no que tange a aproximação da ciência e o cidadão. Cabe a nós, comunicadores, estudarmos novos caminhos e mecanismos mais eficientes para a socialização do conhecimento.

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Soraya Pereira
Jornalista da Embrapa Acre.

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