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ComSaúde 2001: um balanço

Marla Cristiane Araújo Medeiros*

      A temática de saúde ainda é uma abordagem nova no que se refere a sua relação com a comunicação. Embora a comunicação sempre tenha estado presente na prática da saúde, sua aproximação com o campo científico, e como objeto de análise que relaciona um campo ao outro, é um estudo novo aqui no Brasil.
      O impulso pela pesquisa nesta área se intensificou a partir da realização da primeira Conferência de Comunicação e Saúde em outubro de 1998 no Campus da Universidade Metodista de São Paulo em São Bernardo do Campo. Desde então, as discussões da atividade comunicacional como fator determinante na prática da promoção da saúde têm levado pesquisadores ao estudo de práticas que socializem conhecimentos entre estas área.
      Este ano, o COMSAÙDE teve sua 4ª versão realizada na cidade de Vitória, Estado do Espírito Santo, abordando o tema "Comunicação para Saúde da Família". Esta temática foi influenciada pelos bons resultados que a estratégia Saúde da Família está tendo no país. Embora ela só tenha sido implantada no Brasil a partir de 1996, em países como Canadá, Cuba e no continente Europeu, de maneira geral, a estratégia de criar o médico da família e de mudar a ótica da assistência, enfocando –a sob a perspectiva da qualidade de vida, melhorou visivelmente o quadro de saúde, principalmente no que se refere aos cuidados de crianças que detinham dados alarmantes relacionados à mortalidade infantil.
      Embora a estratégia tenha tido início no Brasil em 1996, somente nos últimos dois anos ela tomou proporções atingindo resultados positivos em grande parte do país. Foi a partir desta nova percepção de saúde que vem sendo praticada no Brasil que a estratégia Saúde da Família tornou-se um estímulo para os organizadores do IV COMSAÚDE, debatendo no evento deste ano o papel do comunicador quando se pensa neste novo paradigma de saúde.
      A estratégia Saúde da Família já está implantada em quase todo o país, tem como mentor da proposta o Ministério da Saúde e como principal meta mudar o paradigma de assistência que hoje é concentrado no atendimento hospitalar. O seu foco principal é a promoção e a melhoria da qualidade de vida da população, ratificando o real sentido de saúde, relacionada a construção da cidadania.
      Com este olhar para com a saúde, o evento mereceu destaque pela explanação de três palestrantes que apontaram os desafios científicos e sociais para uma eficiente implantação desta proposta na sociedade brasileira. Foram eles: Luis Alfonso Guadarrama, mestre em Comunicação social pela Universidade Iberoamericana, coordenador do Centro de Investigación y Estúdios Avanzados em Ciências Políticas y Administración Pública além de coordenador executivo da Red Iberoamericana de Investigacion em Família y Médios de Comunicacion y tecnologia FAMECOM,México); o professor Valdir de Castro Oliveira, da UFMG e Abrasco; e Renato Farias, roteirista e apresentador do canal Saúde da Fundação Osvaldo Cruz, professor de interpretação das oficinas da Rede Globo de Televisão, no Rio de Janeiro e São Paulo.
      Esses participantes apontaram, com muita precisão, as questões motivadoras que podem transformar a estratégia Saúde da Família em um eficiente modelo de saúde para o Brasil. O professor Guadarrama mostrou que a estrutura familiar, da forma como foi consolidada ao longo das gerações, distanciando o diálogo, a confiança e a discussão entre o núcleo da família, fragilizou as relações entre os membros da família, provocando um enorme vácuo na orientação familiar que deveria se basear na promoção do amor e na afetividade entre os membros nucleares da família. Esse bloqueio na relação pais e filhos enfraqueceu os vínculos com questões como a sexualidade, o amor e a afetividade. Para o professor Guadarrama, é preciso que voltemos a atenção para a estrutura familiar neste início de século, que prima pelo individualismo e que devemos nos dar conta de que, sem diálogo familiar, não existe instituição familiar forte e que, portanto, está comprometida a eficácia de qualquer ação social .
      O professor Valdir da UFMG abordou, complementando a análise do professor Guadarrama, a importância do processo educativo como transformador de mudanças sociais. Sua proposta é de que a teoria de Paulo Freire representa o caminho de fazer chegar às localidades mais distantes e menos favorecidas a promoção da saúde enquanto prática de cidadania e direito de todos. Como a estratégia de Saúde da Família encerra, em sua essência, a necessidade de uma comunicação interpessoal, e como o processo pedagógico é um processo eminentemente comunicacional, as construções de práticas educativas/comunicativas, a partir dos pressupostos de Paulo Freire, são as mais adequadas, em vista da heterogeneidade que existe na sociedade brasileira e, principalmente, quando se atenta para os grupos que mais precisam ser assistidos.
      E, quase que reafirmando estas contribuições, Renato Farias, da Fundação Osvaldo Cruz, enfatizou a necessidade de mudarmos o olhar da saúde. Segundo ele, para se fazer comunicação para saúde, é necessário adotar um outro olhar, o olhar da saúde enquanto agente de construção da cidadania e não a saúde com enfoque na doença. Para ele, os médicos têm dificuldade de perceber a saúde nesta abrangência e, quando recorrem aos meios, privilegiam a doença. Assim, os meios de comunicação acabam trabalhando o lado negativo da saúde, da mesma forma que a promoção das ações como proteção do meio ambiente, saneamento, cidadania permanece desvinculada do conceito de saúde, quando na realidade são questões interligadas.Certamente, o avanço desse entendimento vai esbarrar nos tabus, e, sob neste aspecto, ele questiona como isso pode ser feito sem ferir o sentido valorativo das pessoas. Provavelmente as pessoas e as estruturas sociais, segundo ele, devessem mudar seu sentido valorativo, o que não é uma coisa fácil, nem simples, muito menos rápida de acontecer.
      Embora possamos encontrar pontos positivos na contribuição de todos os palestrantes, os anteriormente citados sintetizam as necessidades e os desafios que tanto os comunicadores como os profissionais da saúde têm pela frente. As questões levantadas apontam para a essência dos problemas de saúde da nossa sociedade, e somente por via da educação, da cidadania e de uma estrutura social com base numa estrutura familiar mais dialógica é que se caminhará, no Brasil, para um sentido de saúde humanizada.
      Algumas ressalvas no evento podem ser feitas com relação a palestras de alguns profissionais da mídia local que se limitaram a falar das suas experiências profissionais, descontextualizadas do sentido mais aprofundado a que o evento se propunha. Este fato acabou reforçando a visão de ineficácia e de práticas errôneas cometidas pela mídia. Quando se propõe uma discussão que construa um diálogo entre profissionais de saúde e comunicadores, a simples apresentação do processo comunicativo massivo não corrobora com uma ação transformadora. O evento poderia incluir uma avaliação por parte dos participantes, o que certamente apontaria para mudanças a serem implementadas, gerando resultados ainda mais promissores no futuro.

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*Marla Cristiane Araújo Medeiros é jornalista, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da UMESP.

 
 
 
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